"Para compreender é preciso mais que ser favorecido por instrução, ter diplomas e louvores. Não basta ser fino, alinhado, gozar de boa saúde mental; ser fino é necessário para estudar finanças, fazer contabilidade, ou uma estrada, ou um prédio. Mas criar uma base de acção, em que se consegue a boa vontade, o risco, a paixão de intervir, para isso é preciso compreender. E não há muitos assim dotados. Por isso estamos condenados a um impasse muito grave: os finos deliberam, como se compreendessem. Os que observam, filosofam; e os que desconfiam, abusam. Mas compreender, isso é tão raro como ter afecto pelo que não nos dá proveito.
A compreensão é austera mas não azeda. Tem que ver com a experiência profunda e não com as desventuras da vida ainda que as tenha sofrido. Não é um estado de desilusão , mas o resultado duma memória ponderada e do somatório de todos os valores que intervêm na memória, boa ou má que seja. "
Augustina Bessa-Luís, Crónica da Manhã,Guimarães Editores, emitida na Radiodifusão Portuguesa em 20-02-1979
