sexta-feira, janeiro 30, 2015

Histórias de Resende no novo filme de Miguel Gomes "As Mil e Uma Noites", com estreia em Outubro

"(...)Tínhamos um filme para fazer e, logo na primeira semana começámos de imediato a filmar. O Comité Central decidiu ir para uma pequena cidade no Douro, Resende, porque estavam por lá a acontecer coisas que pretendíamos investigar. Isso dá origem a uma das primeiras histórias que Xerazade conta, tendo sido a primeira que filmámos. Nessa altura não havia ainda um guião e, portanto, tratámos de conhecer as pessoas que estavam a viver o caso que era relatado nos jornais.
Eram, na verdade, duas histórias. Uma delas tinha a ver com uma situação insólita: um galo com um processo em tribunal por cantar à noite e acordar os vizinhos. Queriam o galo morto, degolado como Xerazade. Isto estava a acontecer, era real, mas ao mesmo tempo era de ordem surreal, imaginário em estado puro.
No dia seguinte, apareceu outra notícia sobre a mesma cidade. Contava-se que alguém tinha sido detido porque, estando apaixonado, punha fogo para se vingar do facto da namorada o ter trocado por um bombeiro. Para dar trabalho ao bombeiro, arrancando-o, assim, dos braços da sua amada, começou a incendiar metade do concelho. A junção entre o galo que cantava à noite e o homem que punha fogo por ciúme deu o primeiro movimento do filme. Era um desafio perceber como poderíamos juntar estas duas histórias, sendo que a localização era a única coisa que tinham em comum. Isto coincidiu com o momento em que decorriam as eleições autárquicas, que quisemos integrar. Cada notícia colocava-nos questões diferentes que tentávamos reformular e incorporar nas Mil e Uma Noites, fazendo com o que o real parecesse imaginário e o imaginário, real".
Extracto da entrevista de Miguel Gomes ao Ípsilon/Público de hoje